30 de janeiro de 2009

Laís Chaffe à queima-roupa




1) O que é poesia para você?

Poesia
desejo salivando
em frente à mesa
vazia.

2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?

Pra qualquer poeta eu diria o que digo pra mim mesma, também iniciante: vive, lê muito, lê, lê, le(minski).
Mais do que compreender, tem de assimilar como numa transfusão os versos do poeta:

um bom poema
leva anos
cinco jogando bola,
mais cinco estudando sânscrito,
seis carregando pedra,
nove namorando a vizinha,
sete levando porrada,
quatro andando sozinho,
três mudando de cidade,
dez trocando de assunto,
uma eternidade, eu e você,
caminhando junto

(PAULO LEMINSKI)

Repetiria ainda o que ouvi do Fabrício Carpinejar numa oficina literária: Vocês têm de dar à mentira a dignidade da lembrança. Na mesma ocasião, ele lembrou que a gente tem que atravessar o nosso nojo. E ter a brevidade de um desaforo.
Fico por aqui, então.

3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?

Qual pessoa mario me drummond? Vamos aos poemas: A mesa. Poema de sete faces. Consolo na praia. Aniversário.
Autopsicografia. Da vez primeira em que me assassinaram.


Ah, eram só três, né? Ok,

gutfreind a todos,

Laís Chaffe




Nascida em Porto Alegre, Laís Chaffe idealizou e está à frente do selo editorial Casa Verde (www.casaverde.art.br - prêmio Açorianos de Editora Destaque no Rio Grande do Sul/2006) e da Série Lilliput (dedicada a minicontos). Organizou as antologias Contos de bolso, Contos de bolsa e Contos de algibeira e fez a coordenação editorial do livro Contos comprimidos - todos de minicontos. Jornalista e autora de Não é difícil compreender os ETs (contos, AGE, 2002, 112p), participou das antologias Contos do novo milênio (organização Charles Kiefer, 2006), Poemas no ônibus 2002 e 2004, entre colchetes fica mais confortável (contos) e Histórias de trabalho 1999 e 2004. Teve poemas e contos premiados em vários concursos, entre eles: 15º Concurso de Contos Paulo Leminski (PR), 1º Concurso de Poesia da Biblioteca Leverdógil de Freitas (RS), II Concurso Nacional de Literatura Revelação do III Milênio (GO).
É diretora, roteirista e produtora executiva do documentário Canto de cicatriz (37min e 18min, 2005) – Prêmio Direitos Humanos no RS; Galgo Alado de melhor vídeo brasileiro independente e de melhor vídeo social no Gramado Cine Vídeo; destaque feminino no Festival Tudo Sobre Mulheres de Chapada dos Guimarães -; diretora e roteirista do curta-metragem Identidade (15min, 2002); e roteirista e produtora executiva do curta Colapso (15min, 2004). Trabalhou em diversos veículos de comunicação de Porto Alegre, entre eles Correio do Povo, Jornal do Comércio e Rádio Bandeirantes. Em abril deste ano, lançará o livro MINICONTOS E MUITO MENOS, com Marcelo Spalding. Ainda para 2009, prepara um livro de poemas.
Site: www.chaffe.com.br E-mail: lais@chaffe.com.br

27 de janeiro de 2009

Bárbara Lia à queima-roupa





1) O que é poesia para você?

A poesia é o meu ar. Minha forma de expressão. Meu jeito de dizer e narrar e questionar e transformar a realidade ao redor e assim alumbrar almas. Manoel de Barros fala deste – deslumbrar – que a poesia deve causar. Para mim a poesia se apresentou com muitas faces e de diversas maneiras. Na infância era um assombro em forma de épicos que meu pai recitava pela casa bem como a mãe dele - minha avó fantasmagórica - que tinha o dramático atado ao ombro em fragmentos de Camões e versos de Alan Poe. Não me via capaz de escrever um épico. Eu jamais seria Castro Alves ou Gonçalves Dias, penso que isto distraiu meu destino. Confesso que sentia um fascínio incrível por aquilo e meu pensamento menino, a primeira idéia de – o que vou fazer quando crescer? – era mesmo ser escritora. Narrar belas histórias que tocasse as pessoas, como eu me sentia tocada pelos versos e livros. Décadas de sonho engavetado e a poesia veio ao meu encontro, eu já passava dos trinta e cinco anos - alguns versos rabiscados aos vinte se perderam, um único foi salvo por uma amiga que o guardou por 25 anos. Já vivi meio século e a poesia esteve sempre ao lado. A poesia está em lugares inimagináveis. Posso dizer que ela tornou minha vida suportável.


2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?

Penso que cada qual faz o seu caminho. A poesia é universal, mas, cada poeta é único.
Todo poeta não pode fugir, no entanto, da realidade que o cerca e nem da dureza deste ofício. “A terra é sempre sua negra algema” diz Cruz e Sousa aos Assinalados. E ser assinalado tem mais peso que glória e mais dor que alegria. Ainda assim, a poesia pede e ela é uma amante exigente.
O que o poeta deve perseguir de qualquer maneira? O poema. O resto é acréscimo.


3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?

Hilda Hilst, toda a poesia dela. É uma poesia construída com refinamento, mas, tem dentro o humano. Esta aspereza que o amor tem e que ela traduz de forma amorável. Sem nuances piegas ou palavras melosas. Linho antigo e áspero. Pura Arte.

Dos heterônimos de Fernando Pessoa foi Alberto Caeiro que lavou o excesso de seriedade que eu sempre trouxe colado a mim por conta de uma vida burocrática - Há metafísica bastante em não pensar em nada – O guardador de rebanhos. E talvez por comungar com estes versos:

Não tenho ambições nem desejos
Ser poeta não é uma ambição minha
É a minha maneira de estar sozinho.

E Maiakóvski. Li um livro traduzido por Boris Schnaiderman, faz muito tempo. Apanhei na Biblioteca e não guardei o nome. Fiquei totalmente apaixonada por Maiakóvski. Pela poesia revolucionária e pela fragilidade de um homem que escreve uma poesia como aquela para Lila Brik, em lugar de uma carta.



Bárbara Lia nasceu em Assaí, norte do Paraná. Publicou poemas em jornais literários como Rascunho, Garatuja, Mulheres Emergentes, Revista Etcetera, Revista Coyote, Ontem choveu no futuro. Na Internet, tem textos publicados na Revista Germina, Cronópios, Blocosonline, Zunái, Editora Ala de Cuervo, La Lupe – Centro Internacional de Literatura Vanguardista entre outros.
Foi por duas vezes finalista do Prêmio Sesc de Literatura: em 2004 com o romance Cereja & Blues (inédito em livro) e, em 2005, com o romance Solidão Calcinada (publicado em 2008 pela Secretária de Estado da Cultura.

Livros:
O sorriso de Leonardo (Poema – Kafka ed. Baratas, 2.004)
Noir (Poema – ed do autor – 2.006)
O sal das rosas (Poema, Lumme editor – 2.007)
A última chuva (Poema, ME – ed. alternativas – MG – 2.007)
Solidão Calcinada (Romance, Secretaria da Cultura / Imprensa Oficial do Paraná - 2008)

email: barbaralia@gmail.com

22 de janeiro de 2009

20 de janeiro de 2009

Claudio Daniel à queima-roupa




1) O que é poesia para você?

Perplexidade; descoberta; incerteza; encantamento; conflito entre palavra e coisa, sonoridade e sentido; criação de um universo próprio, logo, invenção de linguagem.

2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?

Conquistar um repertório, pela leitura incessante ("a poesia vem da poesia", conforme ensinou Jorge Luis Borges); conquistar um léxico e saber usar as palavras de modo preciso, conforme a intenção estética; conquistar uma sintaxe, que não é apenas a da gramática, mas sobretudo a da imaginação; e conquistar uma mitologia pessoal, pela elaboração de suas próprias obsessões.

3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?

Ou o poema contínuo, de Herberto Helder, pela estranheza imagética, pelo uso de novas metáforas, pela dissonância rítmica, pelo imaginário, pela maneira como o poeta organiza o poema longo.

A morte é uma flor, de Paul Celan, pela arquitetura poética concisa, elíptica, quase silenciosa, que faz de cada poema um enigma a decifrar.

Poesia completa, de João Cabral de Melo Neto, por todo o arsenal de recursos poéticos utilizados pelo autor, especialmente na Anti-Ode, Psicologia da Composição e Fábula de Anfion.



Claudio Daniel, poeta, tradutor e ensaísta, nasceu em São Paulo (SP), em 1962. Publicou os livros de poesia Sutra (ed. do autor, 1992), Yumê (Ciência do Acidente, 1999), A sombra do leopardo (Azougue Editorial, 2001, vencedor do prêmio Redescoberta da Literatura Brasileira, oferecido pela revista CULT) e Figuras Metálicas (Perspectiva, 2005), e o de contos Romanceiro de Dona Virgo (Lamparina, 2004). Publicou também a antologia Na Virada do Século, Poesia de Invenção no Brasil (Landy, 2002), em co-autoria com Frederico Barbosa, e Ovi-Sungo, Treze Poetas de Angola (2007), entre outros livros. Organizou os eventos literários internacionais Galáxia Barroca e Kantoluanda, em 2006, e foi um dos curadores do Tordesilhas, Festival Ibero-Americano de Poesia Contemporânea, em 2007. É editor da revista eletrônica de poesia e debates Zunái (www.revistazunai.com) e mantém o blog Cantar a Pele de Lontra (http://cantarapeledelontra.zip.net). Atualmente, faz mestrado em Literatura Portuguesa na Universidade de São Paulo e exerce o cargo de diretor adjunto da Casa das Rosas, Espaço Haroldo de Campos de Poesia e Literatura.

19 de janeiro de 2009

Esqueci de assinar,
Mariah de Olivieri

Inspiração

Madalena,
Interessante teu comentário, não havia pensado em uma imagem para o acrústico, agora ela já existe...
Gracias

18 de janeiro de 2009

sim

um poema
de amor poderia
assim começar

amo porque
pressinto o fim
gotas a marejar


[Postado por Edson Cruz]

15 de janeiro de 2009

Nicolau Saião à queima-roupa




1) O que é poesia para você?

Busquemos distinguir desde já: há a poesia inerente às coisas, essa que subjaz ao acontecimento de viver com tudo o que lhe pertence – contentamentos e mágoas, sabores e cheiros, os ruídos e o silêncio, o alto e o baixo, o de fora e o de dentro, como sagazmente diziam os antigos ou modernos alquimistas. A poesia que existe no “simples cair dum lenço”, para usar a expressão de Péret.
Ou seja, aquilo que se propicia através da simples existência sensível e nos permite perceber a beleza, como por exemplo dizia Raymond Macherot, “que reside no reflexo dum raio de sol, quase ao crepúsculo, ao bater na porta de madeira dum armário antigo”. Ou, como referia Cesariny, sentir algo “tão alto e seroal/ tão de minha invenção”.
Depois há a poesia que nós fazemos ou que outros fazem, aquela poesia palpável que se constrói ou desconstrói, em todo o caso se forja, através da escrita, da palavra posta na brancura do papel. E que apanhamos dum momento para o outro, de súbito, que nos chega sem sabermos bem de onde veio, de que recantos misteriosos partiu. E, noutras alturas, atingimos depois de um trabalho aturado e que, a uma volta da frase, apanhamos de chofre e logo após guardamos como um tesoiro, como uma descoberta amorável e definitivamente plasmada no tempo e no espaço.


2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?

Se te referes a um iniciante na escrita, no criar poesia mediante a escrita, creio que deve saber escutar os sinais que o rodeiam, as vozes interiores e exteriores que existem e que o poeta, se o é, pode captar para depois lhe possibilitar escrever perduravelmente. Escrever mesmo, ser persistente – é preciso ter músculo para resistir às emboscadas e aos embustes - não escrevinhar ou recrear-se através da escrita, o que os literatos muitas vezes fazem com os piores resultados para os que amam verdadeiramente a poesia e para o que a poesia realmente é.
E ter, de igual modo, a humildade de saber que dependemos dessa coisa um pouco secreta, um pouco velada, um pouco desconhecida, que é a organização das palavras de certa forma algo imprecisa.
A poesia nada tem que ver com a literatura, essa que os aproveitadores ou os simples falsários erguem (como se ergue um bloco de apartamentos...) e que depois habitam com todas as vantagens que em geral esse tipo de gente artilha.
A poesia pode ser e muitas vezes é uma maldição, ou uma incursão no mistério, ou uma aventura no mal, ou uma naturalidade doméstica... Mas nunca um sujeito de literatura, como infelizmente certa gente medíocre ou primária, mas altamente colocada sectorialmente, no país que melhor conheço (Portugal) pretende incutir nas gentes.
Creio que me faço entender...


3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que estas escolhas?

Há poetas de grande qualidade, que profundamente apreciamos, mas cujo mundo enquanto hacedores, contudo, está completamente distante das nossas próprias pesquisas, da nossa pessoal via poética. Dito isto, citaria o nome de Samuel Becket pela exemplar desconstrução do poema e da escrita a que se entregou e submeteu; o de Rilke, pela persistência em excursionar por mundos pouco prováveis de darem rendimento perante os donos da circunstancia temporal e devido à capacidade de se emocionar ante os ritmos do mundo; e o de Czeslaw Milosz, pela coragem que teve de ser poeta autónomo e autentico no recinto de feras em que teve de viver durante largo tempo.
Estes são nomes, note-se, entre vários outros que também poderia epigrafar. Mas são absolutamente representativos do que sinto e por isso os relevo.
Textos referenciais? O que vou dizer talvez não seja muito canónico, mas é sincero e por isso - contra ventos e marés, rs – aqui o deixo dito (se o não fizesse estaria a atraiçoar a minha juventude de forma repelente e cobarde): alguns textos que mais me fizeram sentir a maravilha, a variedade da escrita, foram – nos meus 14/15 anos os que encontrei nas Selecções do Reader's Digest (edição brasileira) dos tempos da Segunda Guerra Mundial e que estavam na biblioteca de meu padrinho. Eram extractos de obras da literatura universal, tanto ali se encontravam trechos de Vítor Hugo como de Garrett, de Victor Heiser como de Henry Morton Stanley, etc.
Isto em primeiro lugar. Seguidamente, pedaços da monumental obra de Alves Morgado “História da Criação dos Mundos”. Depois e finalmente, reflexões de “Ofício de viver” e alguns poemas singulares de “Trabalhar cansa” de Cesare Pavese, em paralelo com o extraordinário trecho sobre a génese da criação poética inserida a dada altura no rilkeano “Os cadernos de Malte Laurids Brigge”.

Atalaião, Jan. de 09




Nicolau Saião – Monforte do Alentejo (Portalegre) 1946. É poeta, publicista, actor-declamador e artista plástico. Em 1992 a Associação Portuguesa de Escritores atribuiu o prémio Revelação/Poesia ao seu livro “Os objectos inquietantes”. Autor ainda de “Assembleia geral” (1990), “Passagem de nível”, teatro (1992), “Flauta de Pan” (1998), “Os olhares perdidos” (2001), “O desejo dança na poeira do tempo”, “Escrita e o seu contrário” (a sair).
No Brasil foi editada em finais de 2006 uma antologia da sua obra poética e plástica (“Olhares perdidos”) organizada por Floriano Martins para a Ed. Escrituras. Pela mão de António Cabrita saiu em Moçambique (2008), “O armário de Midas”, estando para sair “Poemas dos quatro cantos”(antologia). Fez para a “Black Sun Editores” a primeira tradução mundial integral de “Os fungos de Yuggoth” de H.P.Lovecraft (2002), que anotou, prefaciou e ilustrou, o mesmo se dando com o livro do poeta brasileiro Renato Suttana “Bichos” (2005).
Organizou, coordenou e prefaciou a antologia internacional “Poetas na surrealidade em Estremoz” (2007) e co-organizou/prefaciou ”Na Liberdade – poemas sobre o 25 de Abril”.
Tem colaboração dispersa em espaços culturais de vários países: “DiVersos” (Bruxelas/Porto), “Albatroz” (Paris), “Agulha”, “Cronópios”, “Jornal de Poesia”, “António Miranda” (Brasil), Mele (Honolulu), “Bicicleta”, “Espacio/Espaço Escrito (Badajoz), “Saudade”, “La Lupe”(Argentina), “Petrínea”, “Sílex”, “Velocipédica Fundação”, “Jornal de Poetas e Trovadores”, “A Xanela” (Betanzos)...
Participou em mostras de Arte Postal em países como Espanha, França, Itália, Polónia, Brasil, Canadá, Estados Unidos e Austrália, além de ter exposto individual e colectivamente em lugares como Lisboa, Paris, Porto, Badajoz, Cáceres, Estremoz, Figueira da Foz, Almada, Tiblissi, Sevilha, etc.
Nos anos 90 orientou e dirigiu o suplemento literário “Miradouro” e com João Garção e Ruy Ventura coordenou “Fanal”, suplemento cultural mensal alentejano, de Março de 2000 a Julho de 2003. Organizou, com Mário Cesariny e C. Martins, a exposição “O Fantástico e o Maravilhoso” (1984) e, com João Garção, a mostra de mail art “O futebol” (1995). Concebeu, realizou e apresentou o programa radiofónico “Mapa de Viagens” (36 emissões) e está representado em antologias de poesia e pintura. O cantor espanhol Miguel Naharro incluiu-o no álbum “Canciones lusitanas”. Até se aposentar recentemente foi durante 14 anos o responsável pelo Centro de Estudos José Régio, na dependência do município de Portalegre. É membro honorário da Confraria dos Vinhos de Felgueiras. Em 1992 o município da sua terra natal atribuiu-lhe o galardão de Cidadão Honorário e, em 2001, a cidade de Portalegre comemorou os seus 30 anos de actividade cívica e cultural outorgando-lhe a medalha de prata de Mérito Municipal. Vive em Atalaião, pequeno agregado populacional a nordeste da capital distrital lagóia. E-mail: nicolau19@yahoo.com

13 de janeiro de 2009

Glauco Mattoso à queima-roupa




[1] O que é poesia para você?

GM: Já dei várias respostas a essa pergunta, mas acho que a melhor foi aquela que usei numa oficina que ministrei na Casa das Rosas: a poesia é uma metralhadora na mão dum palhaço. Seu poder de fogo pode ser apenas intencional, e seu efeito apenas hilário, mas o franco-atirador, ao expor-se em sua ridícula revolta, no mínimo consegue provocar alguma reação, ainda que meramente divertindo o público, e alguma reflexão sobre o papel patético dos idealistas e visionários, que, no fundo, somos todos nós.

[2] O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?

GM: Depende justamente da concepção poética que ele adotou. No meu caso, trata-se de vomitar algo visceral, de me expor, me devassar e desabafar uma biografia excêntrica para me identificar com outros excêntricos e tirar, dessa diversidade de individualidades, o traço de humanidade que nos une, isto é, o sofrimento e a revolta contra as opressões e repressões. Uma das "missões" do poeta - mas não a única - é ser porta-voz dos perseguidos, injustiçados, excluídos, rejeitados e humilhados, ainda que tais angústias sejam meramente sentimentais ou emocionais - frustrações amorosas, por exemplo. Voltando à questão do iniciante, eu recomendaria três coisas: primeiro, muita leitura, poesia de várias épocas e estilos, para estabelecer preferências e simpatias; segundo, fidelidade à própria biografia, nada de fingir demais, ainda que o poeta seja um fingidor, como dizia Pessoa; terceiro, estudar versificação, mesmo que o cara não pretenda fazer poesia rimada nem metrificada. Assim, ele estará minimamente instrumentado para o "ofício".

[3] Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético.
Por que destas escolhas?


GM: Isso é sempre muito pessoal e intransferível, mas vamos lá. Gregório de Matos, por ser pioneiro na nossa história e por ter praticado duas coisas que utilizo: os jogos verbais barrocos (antíteses, paradoxos, paronomásias, paródias, trocadilhos) e sátira desbocada (inclusive enveredando pelo fescenino); Bocage, por duas características que adotei: apuro formal do soneto e deboche obsceno; Bandeira, por uma única e fundamental razão: provar que é perfeitamente possível praticar todas as modalidades poéticas, desde o verso mais ritmado e rimado até o experimentalismo mais iconoclasta e anárquico, sem perder de vista o lado humano, confessional e emocional. Quanto aos textos referenciais, sugiro, primeiro, "Os Lusíadas", não para ler de cabo a rabo, mas para passear nele, viajar no ritmo, ir se acostumando a discorrer, raciocinar metrificando, pensar em decassílabo; segundo, "Eu", de Augusto dos Anjos, para, ao contrário dos "Lusíadas", percorrer, num único e curto livrinho, toda a obra duma vida, o que nos dá noção de que o poder de síntese pode ser essencial e suficiente; terceiro, "Poesia completa e prosa", a obra reunida do Manuel Bandeira, que tenho em papel-bíblia mas que existe em diferentes edições, incluindo o "Itinerário de Pasárgada", roteiro autobiográfico-intelectual, e a "Apresentação da poesia brasileira", que, embora incompleta e parcial, dá uma visão panorâmica.


Glauco Mattoso (paulistano de 1951) é um dos mais radicais representantes da ficção erótica e da poesia fescenina em língua portuguesa, descendente direto de Gregório, Bocage e, em prosa, de Sade e Masoch. Na década de 1980, celebrizou-se entre a "marginália" literária como autor do fanzine anarco-poético "Jornal Dobrabil" e do romance fetichista "Manual do podólatra amador" (reeditados, vinte anos depois, respectivamente pela Iluminuras e pela Casa do Psicólogo); após perder a visão, já na década de 1990, publicou mais de vinte volumes de poesia (entre os quais a antologia "Poesia digesta: 1974-2004", pela Landy), além do romance paródico "A planta da donzela" (editado pela Lamparina), que revisita "A pata da gazela" de Alencar. Adepto fervoroso da glosa decimal e do soneto clássico, destaca-se também como lexicógrafo no bilíngüe "Dicionarinho do palavrão" (pela Record) e como esticólogo numa "Teoria do soneto" e num tratado de versificação, "O sexo do verso: machismo e feminismo na regra da poesia", a sair em livro. Colaborador nas mídias impressa e virtual, assina colunas na revista "Caros Amigos" e no portal "Cronópios", entre outros veículos. Como letrista, tem sido musicado por nomes singulares do porte de Arnaldo Antunes, Itamar Assumpção, Falcão, Ayrton Mugnaini e outros experimentalistas independentes ou irreverentes. Seus livros mais recentes vêm saindo pela Dix Editorial (da Annablume), na série "Mattosiana", entre os quais uma história do rock e uma pesquisa do cancioneiro popular brasileiro, tudo em forma de soneto. Eis os endereços e contatos:
www.annablume.com.br
http://glaucomattoso.sites.uol.com.br
glaucomattoso@uol.com.br

11 de janeiro de 2009

Acrústico

Perdemos
Esperanças,
Resta
Dor.
Ausência
Sofrida.

Invade,
Rasga,
Revolve,
Estupra,
Profana,
Arrasa,
Retorce
Átomos.
Violenta,
Esmiúça,
Isola
Sempre.


[Postado por Mariah de Olivieri]

10 de janeiro de 2009

Sigamos com a renga...



Respostas ao inquérito:

Começo pelo final, para mim Poesia é um arrastão, uma renga, uma reciclagem diária rumo a metáforas e metonímias, portanto aproveito a deixa de Ricardo Silvestrin, para seguir o Inquérito Poético e dizer que justamente o que sobra , quando não é silêncio, é conVersa e em mim poiética, um caminho a revelação Poética.

Ferreira Gullar, Cabral, Emily Dinckinson, além de Dobrar as Esquinas da Vida, não se cansam, caso necessário de trabalhar 10 anos tecendo um manhã, feito galos, para que um poema nasça em cada qual que eu encontro.
Sigo com eles, elejo seu textos para evidenciar a importância do con-texto, além de qualquer movimento, suas vozes são uma ecologia de linguagem.

1) O que é poesia para você?

Poesia é isso, créditos de outros créditos para seguir existência, seja em Livro, seja em palavra, versos que convesam...
Então, para fugir desta derradeira verdade buscamos morrer num ponto, numa respiração, num encontro, em um trabalho que nos dignifique como humanos, passagens em travessia.
Também por isso, para mim, a Poesia é a mãe da linguagem e deve estar em todo Bom Escrito Literário.
Penso que o ser poiético busque um tempo menos cego que o simples calendário, que o contar dos ponteiros, mas mais simbólico para dar conta do real avassalador que está atravessado em seu olhar, em sua escuta e passos.
Poesia para mim é viver dos próprios olhos, por isso é uma construção diária, um trabalho intenso, porque para morrer basta nascer. E para não morrer de qualquer maneira, buscamos nossa respiração, trabalhamos, esculpimos e inventamos palavras, deslocamos vazio, perseguimos o que não está, para um dia ser, simplesmente Ser.

2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?

Não ter medo de errar, abusar da criatividade, se melecar de palavras e de outros e, principalmente, saber que no princípio todos imitamos alguém, mas no final Poesia, mais do que classificação, será estilo por ser sempre um intenso trabalho subjetivo, ainda imensurável, mas muito cantado, falado.
Podemos mensurar o valor de um prédio, porém como saberemos do Valor Poético a não ser ao compartir versos, leituras e vivências?
Com isso, quero dizer, que o mais difícil para o fazer poético é matar o próprio narciso, o que sucede com qualquer humano. No entanto, a diferença está que no fazer poético ele não se cala e grita e escreve e inventa para seguir re-invenção a mais Criação, um amor real de construção...


Carmen Silvia Presotto, nascida em Sarandi – RS, em 27 de agosto de 1957. Professora Graduada em Língua Portuguesa e Literatura Clássica pelo Instituto de Letras da UFRGS em 1981. Obteve formação psicoanalítica junto a Escola Brasileira de Psicoanálise e Poesia Grupo Cero, onde exerceu atividades psicanalíticas até o ano de 2006. Publicou em coletâneas. Integrou as Oficinas Literárias Scrivere; Atelier da Palavra; Verbo Cronicar; Grupo de Poesia Grupo Cero, onde também coordenou encontros poéticos e a Revista de Poesia Àguaviva. Integrou as oficinas de Poesia com Fabrício Carpinejar; A Poesia em tempo de Internet com Edson Cruz; Oficinas de Memória Narrativa com Luís Augusto Fischer, Paisagem e Cultura da Grécia Clássica com Franscisco Marshall, no StudioClio, onde segue os Ciclos de Filosfia Grega e Contemporânea com Donaldo Schüler. Autora das Obras – Dobras do Tempo e Encaixes. Coordenadora Contextual do Site www.vidraguas.com.br

9 de janeiro de 2009

Ricardo Silvestrin à queima-roupa



1) O que é poesia para você?
Um texto da função poética da linguagem. Ver o meu artigo Balanço, mas não caio. Ali, está uma explicação clara e um pouco rápida sobre essa função.

2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
Deve ler boa poesia e bons ensaios a respeito do tema poesia (Roman Jakobson e as funções da linguagem, Haroldo de Campo em A Arte no Horizonte do Provável, Décio Pignatari em Comunicação Poética, Otávio Paz no Signos em Rotação...). Ou seja, deve se ocupar de ler bons poetas para ver o fazer dos outros e também se ocupar do pensar sobre a arte da poesia, tanto sozinho como acompanhado pelos bons pensadores/poetas/críticos. Também conta fazer cursos e/ou oficinas com bons poetas. Tudo isso para perseguir a criação de, primeiro, um bom poema. Depois, um bom poema que tenha as contribuições pessoais à contemporaneidade e, por último, se conseguir, alguma contribuição à história do gênero poético.

3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?

Fiz três trios:

Bandeira/Drummond/Quintana – esse trio foi o primeiro time que me fez entender o que é um bom poema. Comecei a escrever depois que li o Bandeira. Até hoje, ele é o poeta que mais encanta. Equilibra invenção, idéia e sensibilidade. Uma boa leitura é essa dos 50 poemas escolhidos, seleção feita por ele, reeditada recentemente pela Cosac Naify.

Chacal/Leminski/Alice Ruiz – esse foi o segundo trio que me reabriu a cabeça. Com eles, encontrei uma linguagem mais próxima da minha geração e da minha visão de mundo. Ler o Belvedere, reunião da poesia do Chacal, lançada pela Cosac, 2 em 1 com os dois livros Pelos Pelos e Vice-versos da Alice, lançado recentemente pela Iluminuras, e Caprichos e Relaxos, Distraídos Venceremos... e tudo o que achar do Leminski. Valem também os ensaios do Leminski, as biografias que ele escreveu de Bashô, Cruz e Souza...

Augusto/Haroldo/Décio – esse trio chuta a bola para outros campos, amplia a cabeça de qualquer poeta. Ler Viva Vaia do Augusto, Não, Despoesia, todos do Augusto – Poetc., Poesia, pois é poesia, do Décio, A educação dos 5 sentidos, do Haroldo. E também tudo o que eles lançaram de teoria e tradução.

E sobram ainda os simbolistas, com o quarteto Rimbaud/Mallarmé/Verlaine/Baudelaire, sobram Marcial, Bashô, Issa, Ferreira Gullar, Cabral, Emily Dinckinson, Benedetti, Borges...




Ricardo Silvestrin é autor dos livros de poesia O menos vendido, ex-Peri,mental, Palavra mágica, Quase eu, Bashô um santo em mim e Viagem dos olhos, além dos infantis O baú do Gogó, Pequenas observações sobre a vida em outros planetas, É tudo invenção, Mmmmonstros! e Transpoemas. Lançou em 2008 o livro de contos Play. Integra o grupo musical os poETs. É editor da ameopoema. Recebeu por 3 vezes o Prêmio Açorianos de Literatura. Assina uma coluna no Segundo Caderno do jornal Zero Hora. Apresenta o programa Transmissão de Pensamento na Rádio Ipanema FM. Site: www.ricardosilvestrin.com.br E-mail: silvestrin@uol.com.br

[Postado por Edson Cruz]

7 de janeiro de 2009

Três perguntas para poetas

Estou fazendo um inquérito (quase policial) com os principais poetas em atividade, sejam novos, novíssimos, ou já tarimbados e carimbados pelo tempo ou pelo (des)reconhecimento.

As perguntinhas são só três, pois é um numero que deixa as coisas em aberto e incita o movimento, o seguir adiante – diferentemente do dois e do quatro. São básicas, mas nem por isso menos espinhosas. Alguns poetas já reagiram a elas. A primeira é considerada quase ofensiva para alguns. Se muitos responderem poderemos ter, provavelmente, um vasto apanhado de idéias e de fazeres que nos farão pensar e repensar, pois uma das características da poesia moderna (e da pós-moderna, se ela existir...) é a imensa variedade de perspectivas e de fazeres.


Nicolas Behr responde:

[foto de Juan Pratginest]


1) O que é poesia para você?
POESIA É TUDO O QUE VOCE ESTÁ SENTINDO AGORA.

2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?
UM CONSELHO: LER MUITO, ESCREVER MUITO E RASGAR MUITO.
SÓ PUBLICAR (EDIÇAO DE AUTOR) QUANDO ESTIVER BEM SEGURO. CORAGEM É MAIS IMPORTANTE QUE CRIATIVIDADE. POESIA EM BLOG VOCE APAGA, EM LIVRO NÃO. LIVRO É MAIS IMPORTANTE QUE BLOG.

3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?
POEMA EM LINHA RETA, DE FERNANDO PESSOA. OS OMBROS SUPORTAM O MUNDO, DE DRUMMOND E QUEM FAZ UM POEMA ABRE UMA JANELA, DE MARIO QUINTANA. SÃO OS UNICOS POEMAS QUE EU SEI DE COR.


Nicolas Behr (Nikolaus Von Behr) nasceu em Cuiabá, em 1958. Queria ser geólogo e mora em Brasília desde 1974. Em 1977, lançou seu best seller “Iogurte com Farinhas”, em mimeógrafo. Em agosto de 1978, após ter escrito “Grande Circular”, “Caroço de Goiaba” e “Chá com Porrada” foi preso e processado pelo DOPS por “porte de material pornográfico”, sendo julgado e absolvido. Trabalhou como redator de publicidade e, posteriormente, na Fundação Pró-Natureza. Dedicou-se, profissionalmente, a produção de mudas de espécies nativas do cerrado. A partir de 1993, voltou a publicar seus livros de poesia, com “Porque Construí Braxília”. É sócio-proprietário da Pau-Brasília Viveiro Eco.loja. Mantém o site WWW.nicolasbehr.com.br, e-mail: paubrasilia@paubrasilia.com.br . Você pode conferir, também, uma seleta de seu novo trabalho em www.cronopios.com.br/site/poesia.asp?id=3715

[Postado por Edson Cruz]

5 de janeiro de 2009

NÃO (1990)

meu amor dor
não é poesia
amar viver morrer
ainda não é poesia

escrever pouco ou muito
calar falar
ainda não é poesia

humano autêntico sincero
mas ainda não é poesia

transpira todo o dia
mas ainda não é poesia

ali onde há poesia
ainda não é poesia

desafia
mas ainda não é poesia

rimas
ainda não é poesia

é quase poesia mas
ainda não é poesia


[Trucidei a forma (está no livro NÃO POEMAS,de 2003, Perspectiva) deste poema de Augusto de Campos, pois vejo nele a explicitação da poética buscada por Augusto e que nos diz muito. Parece-se com o poema (e a poética) de Drummond, "Procura da poesia". Postado por Edson Cruz]